quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Como vou explicar isso?

Ela faz eu lembrar de minha mãe, quando ainda era nova, talvez por isso eu sentira uma atração tão profunda. Apesar dos 25 anos, ela parece ter 15, apesar da jovialidade ela aparece estar bem abatida, talvez seja o álcool, não sei mais o que ela usou. Então nós beijamos, ela tem um ar puritano, olhos meigos e parece que o mundo anda a espetando com lanças macabras, ainda assim ela sorri e se beijamos com intensidade, eu toco seu rosto pra saber que é ela mesma quem beijo, sua pele é macia e o gosto da intimidade nua melhor ainda, era como se voltasse ao leite da minha mãe, ela realmente parece muito com ela, tem o mesmo sorriso, o mesmo tom de cabelo, me afagava e me sentia protegido por ela, por mais que o fossem machista, todos procuram abrigo no braço de um mulher, como se voltasse a infância, a eterna mulher protetora de nós homens, quando vejo estou crescido num ambiente hostil e não existe para quem se correr aos braços, minhas mãe não está mais aqui por eu chamar por ela, então nós abraçamos e trocamos caricias porque ambos tem medo.
Não tivemos uma boa transa, mas ela dorme suave, na penumbra vejo o tom claro de sua tez, seus cabelos longos se esparramam pelas costas. Osculo o ombro dela, minha mão corre por seu antebraço, meus dedos investigam o membro todo, sinto falta da minha mãe, sinto ganas de abraçá-la e chorar um pouco, faz algum tempo que sinto saudade, eu quem pensei que ia morrer logo quando tu se fosse, mas não morri, fiquei vagando aqui como uma alma perdida, sabe mãe, seu filho tem pensado coisas estranhas desde pequeno, agora que se foi embora, parece que nada tem tanta importância assim, aquele dragão dentro de mim que você fazia dormir cantando, está acordando deste sono profundo sedento por diabruras.
Eu acho que não posso mais aguentar ele dentro de mim sozinho, eu choro lembrando de você, sinto desejo de matá-la, uma moça que parece tanto com minha mãe... Eu tremo, choro baixinho, desculpa tá pensando tudo isso mãe, não sei por que isso foi acontecer comigo, eu acho que eu fiquei louco de vez depois que morreu, eu estou falando com uma morta através de um corpo humano ainda vivo, como se você fosse ouvir minhas preces, talvez fosse melhor você não estar aqui, meu coração ferve, meu coração parece que vai explodir, não sei se é culpa da droga, mas parece que vou morrer se eu não tirar a besta de dentro de mim.
Afaguei uma última vez o rosto dela, pedi desculpas a minha mãe e degolei a menina, ela acordou assustada no mesmo instante, como num pesadelo, olhou horrorizada para minha sombra e deve ter morrido se imaginando num sonho, seu sangue esguichou para a cama toda, vi ela morrer com um sorriso no meu rosto, rindo e escorrendo lágrimas nos meus olhos, eu queria gargalhar. Lembrei que ela disse que não estava se sentindo bem trazendo um estranho pra casa, alguém que não conhecia. Não, nunca devemos confiar em alguém neste tipo de mundo, foi o que minha mãe sempre ensinou.
A abracei suspirando fundo enquanto ainda ouvia os gorgulhos de sangue dela, se retorcia inteira com as mãos fincada em meus braços tentando dizer algo, mas só sangue espirrava de sua boca, ela morreu logo, suas unhas cravadas em mim. A abracei com mais intensidade, alisei os cabelos dela e beijei sua fronte, toquei o sangue que acabava de escorrer, acariciei a maçã do rosto dela, suspirei e pedi desculpas outra vez. Minha dor no coração havia ido embora.
Levantei nu da cama, sai do quarto para sala, abri a janela e as cortinas, do 15° andar eu via um cemitério logo em frente, túmulos e mausoléus se destacando em meio a escuridão. Fiquei ali por um tempo respirando ar fresco, havia sangue pelo meu corpo também. Me limpei no chuveiro dela, a água caía morna, estava sentado tirando o sangue seco do meu corpo.

Me enxuguei e fiquei ainda pelado na porta do banheiro, fitei-a desfalecida, pálida se destacando na escuridão. Cheguei mais perto e o colchão tinha absorvido boa parte do sangue, mas ainda tinha uma poça úmida, levantei seu cadáver e o arrastei como pude até a sala, o deitei no sofá vendo o pescoço pendido e os dedos rijos da forma como cravara em mim, tentei deixá-los numa posição menos assombrosa, mexi nos olhos dela também, agora parecia um anjo dormindo, caí por cima dela, o sangue ainda colando e ali fiquei dormindo ao lado do cadáver contando como foi acontecer tudo aquilo.

11/01/2017