Ela faz eu lembrar de minha mãe, quando ainda
era nova, talvez por isso eu sentira uma atração tão profunda. Apesar dos 25
anos, ela parece ter 15, apesar da jovialidade ela aparece estar bem abatida,
talvez seja o álcool, não sei mais o que ela usou. Então nós beijamos, ela tem
um ar puritano, olhos meigos e parece que o mundo anda a espetando com lanças
macabras, ainda assim ela sorri e se beijamos com intensidade, eu toco seu
rosto pra saber que é ela mesma quem beijo, sua pele é macia e o gosto da intimidade
nua melhor ainda, era como se voltasse ao leite da minha mãe, ela realmente
parece muito com ela, tem o mesmo sorriso, o mesmo tom de cabelo, me afagava e
me sentia protegido por ela, por mais que o fossem machista, todos procuram
abrigo no braço de um mulher, como se voltasse a infância, a eterna mulher
protetora de nós homens, quando vejo estou crescido num ambiente hostil e não
existe para quem se correr aos braços, minhas mãe não está mais aqui por eu
chamar por ela, então nós abraçamos e trocamos caricias porque ambos tem medo.
Não tivemos uma boa transa, mas ela dorme
suave, na penumbra vejo o tom claro de sua tez, seus cabelos longos se
esparramam pelas costas. Osculo o ombro dela, minha mão corre por seu
antebraço, meus dedos investigam o membro todo, sinto falta da minha mãe, sinto
ganas de abraçá-la e chorar um pouco, faz algum tempo que sinto saudade, eu
quem pensei que ia morrer logo quando tu se fosse, mas não morri, fiquei
vagando aqui como uma alma perdida, sabe mãe, seu filho tem pensado coisas
estranhas desde pequeno, agora que se foi embora, parece que nada tem tanta
importância assim, aquele dragão dentro de mim que você fazia dormir cantando,
está acordando deste sono profundo sedento por diabruras.
Eu acho que não posso mais aguentar ele dentro
de mim sozinho, eu choro lembrando de você, sinto desejo de matá-la, uma moça
que parece tanto com minha mãe... Eu tremo, choro baixinho, desculpa tá
pensando tudo isso mãe, não sei por que isso foi acontecer comigo, eu acho que
eu fiquei louco de vez depois que morreu, eu estou falando com uma morta
através de um corpo humano ainda vivo, como se você fosse ouvir minhas preces,
talvez fosse melhor você não estar aqui, meu coração ferve, meu coração parece
que vai explodir, não sei se é culpa da droga, mas parece que vou morrer se eu
não tirar a besta de dentro de mim.
Afaguei uma última vez o rosto dela, pedi
desculpas a minha mãe e degolei a menina, ela acordou assustada no mesmo
instante, como num pesadelo, olhou horrorizada para minha sombra e deve ter
morrido se imaginando num sonho, seu sangue esguichou para a cama toda, vi ela
morrer com um sorriso no meu rosto, rindo e escorrendo lágrimas nos meus olhos,
eu queria gargalhar. Lembrei que ela disse que não estava se sentindo bem
trazendo um estranho pra casa, alguém que não conhecia. Não, nunca devemos
confiar em alguém neste tipo de mundo, foi o que minha mãe sempre ensinou.
A abracei suspirando fundo enquanto ainda ouvia
os gorgulhos de sangue dela, se retorcia inteira com as mãos fincada em meus
braços tentando dizer algo, mas só sangue espirrava de sua boca, ela morreu
logo, suas unhas cravadas em mim. A abracei com mais intensidade, alisei os
cabelos dela e beijei sua fronte, toquei o sangue que acabava de escorrer,
acariciei a maçã do rosto dela, suspirei e pedi desculpas outra vez. Minha dor
no coração havia ido embora.
Levantei nu da cama, sai do quarto para sala,
abri a janela e as cortinas, do 15° andar eu via um cemitério logo em frente,
túmulos e mausoléus se destacando em meio a escuridão. Fiquei ali por um tempo
respirando ar fresco, havia sangue pelo meu corpo também. Me limpei no chuveiro
dela, a água caía morna, estava sentado tirando o sangue seco do meu corpo.
Me enxuguei e fiquei ainda pelado na porta do
banheiro, fitei-a desfalecida, pálida se destacando na escuridão. Cheguei mais
perto e o colchão tinha absorvido boa parte do sangue, mas ainda tinha uma poça
úmida, levantei seu cadáver e o arrastei como pude até a sala, o deitei no sofá
vendo o pescoço pendido e os dedos rijos da forma como cravara em mim, tentei deixá-los
numa posição menos assombrosa, mexi nos olhos dela também, agora parecia um
anjo dormindo, caí por cima dela, o sangue ainda colando e ali fiquei dormindo
ao lado do cadáver contando como foi acontecer tudo aquilo.
11/01/2017